Significados que acolhemos
Bárbara.
Como resposta, obtive conhecimento da existência de Santa Bárbara e Bárbara Paz. Minha mãe me contou que, a pedido de minha avó, meu nome fosse Bárbara, como o da santa. E, para minha mãe, que achava Bárbara Paz muito bonita, o pedido era um bom sinal.
Sem muitos questionamentos na minha cabeça de criança, essa resposta me bastou e a levei para a sala de aula. Lá, a professora me exibiu o significado do nome retirado da internet.
Estrangeira. Forasteira.
Enquanto todos os meus colegas tinham nomes com significados como "iluminada", "protegido por Deus", "escolhido do Senhor", "pureza" e essas variações, para mim, apesar de gostar do meu nome, o significado parecia um insulto.
Fiquei, é claro, muito infeliz e resignada. Durante anos, quando o tema significado do nome era levantando, eu me limitava a falar, consternada, que meu nome tinha um significado estranho: estrangeira.
Com o passar dos anos, descobri que gostava do fato de meu nome ser também um adjetivo. Um elogio ou insulto embutido em minha pessoa. Os significados, na verdade, são vários:
bár·ba·ro
(latim barbarus, -a, -um, bárbaro, estrangeiro, inculto, selvagem)
adjetivo e substantivo masculino
1. Que ou quem é estrangeiro, ou não falava grego ou latim, em relação aos gregos e romanos da Antiguidade.
2. Que ou quem é rude ou grosseiro; que ou quem não é considerado civilizado.
3. Que ou quem tem comportamento violento. = SELVAGEM
adjetivo
4. [Brasil, Informal] Que revela qualidades positivas (ex.: som bárbaro, roupas bárbaras, conceito bárbaro). = BACANA
interjeição
5. [Brasil, Informal] Exclamação usada para indicar admiração, aprovação ou entusiasmo.
"bárbara", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/b%C3%A1rbara
Minha visão sobre o significado do meu nome passou a ser mais positiva. Falava, alegre, sobre a origem e história do significado que me fora resumido pela palavra estrangeira. No entanto, ainda não sentia a emoção que eu imaginava que pessoas com significados mais profundos relacionados aos seus nomes sentiam. Era uma estranha ao meu nome.
Ao mesmo tempo, enquanto eu crescia, notava interesses e objetivos em mim que nunca foram incentivados pelos meus pais. Sendo pessoas simples, eles sempre me ensinaram que estudar era importante, mas nunca colocaram em prática e sentaram comigo para exercitar seus ensinamentos. Desde pequena, eu fazia todos os meus deveres de casa sozinha, tirava notas boas e prestava atenção na aula sem nenhuma vigilância externa. Comecei a ler livros na casa dos 10 anos, pegando na biblioteca da escola e ganhando usados da enteada de uma tia. Daí para frente, meus pais ficaram muito felizes com meu gosto pela leitura que eles mesmos admitiam não ter influência alguma.
Minhas ambições não pararam nos livros. No último ano do ensino fundamental, descobri pelos meus amigos o Instituto Federal Fluminense, local onde todos queriam estudar. O curso dito mais difícil era Informática e, claro, foi esse que eu escolhi. Após fazer a prova, fui aprovada e aprendi coisas muito legais. Programar em C++, JavaScript, Python. Criar um servidor DHCP (mesmo que ele não tenha funcionado muito bem). Fazer sites utilizando HTML. A maioria desses conhecimentos foi perdido da minha cabeça, já que, infelizmente, quando não pratico, esqueço tudo. Mas os três anos no IFF em período integral foram ótimos e sempre vou me recordar com carinho.
Nesse momento da história, eu já sabia uma coisa: queria estudar em uma boa faculdade e ir pra uma cidade grande. Queria viajar, conhecer novos lugares. Queria ter liberdade para ser algo que eu nunca fui. Queria ser uma forasteira por aí.
Assim que saí do ensino médio, com a cabeça recheada de códigos e conhecimentos sobre tecnologias, iniciei o curso de Engenharia Naval na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mesmo morando no estado, eu nunca havia ido ao Rio. No extremo norte, fazendo divisa com uma cidade do Espírito Santo, a pequena Bom Jesus do Itabapoana era meu lar.
Em pandemia, cursei um ano da faculdade no EAD para perceber que eu jamais poderia ser feliz atuando nessa área. Sob a alegria de minha mãe, que tinha medo da minha mudança para uma cidade grande e violenta, tranquei a faculdade e passei um ano estudando para o Enem.
Agora, numa sexta feira à noite, ao som de clássicos do MBP, sentada em uma cama dentro de uma pequena kitnet em São Paulo, digito esses devaneios como um exercício da minha escrita. Acho importante um jornalista escrever bem. Se quero entregar textos de qualidade, tenho que me esforçar além do que é dado na faculdade.
É, depois de muitos receios e dificuldades, estou na Universidade de São Paulo. Se eu dizer que nunca me imaginei aqui, será mentira. Sempre tive sonhos muito grandes, mas não pensava que conseguiria realizá-los. Não tenho uma família rica, não tive cursos particulares de valores exorbitantes. Estudei em um cursinho online que custava 20 reais por mês, Trabalhei e juntei economias pensando no momento em que precisaria alugar um local e ainda não teria os auxílios da universidade. Mandei diversos documentos e comprovantes de que “sim, eu preciso mesmo de ajuda financeira, Estado!”. Eu sequer sei falar inglês de forma decente... Mesmo com tudo isso, eu acreditei em mim. E isso foi o mais importante.
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Foto de Caio do Valle |
Gosto de ser estranha aos lugares, gosto de ser forasteira. Espero que São Paulo seja apenas o primeiro destino que eu vislumbre e transforme em palavras pelos meus olhos de estrangeira.
O nome Bárbara me cai muito bem.
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